O paulistano é fadado a uma resignada (e contraditória) insatisfação
Nas catedrais góticas, chamavam atenção as proporções excentricamente exageradas: as colunas eram muito grossas, o espaço interno era muito amplo e o teto, alto demais. Tudo aquilo foi cuidadosamente pensado para transmitir quase subliminarmente uma constante mensagem: “Você é insignificante perante a esmagadora grandeza de Deus.”
Portanto, a Grande São Paulo com certeza é a maior catedral neo gótica do Brasil — do mundo, talvez? Para onde quer que você olhe — até mesmo para o céu, se conseguir o encontrar em meio aos prédios — lá está ela. Ela, que esfrega em nossa cara nossa insignificância perante a esmagadora grandiosidade de… quem? Deus? Está mais para ‘o capital’ (com iniciais maiúsculas ou não, você decide).
“Vivemos na maior cidade da América do Sul”, escreveu Caetano Veloso em seu esmagadoramente grandioso hit “Baby”. São Paulo é um dos maiores pontos de encontro de diferentes culturas, tradições e civilizações do mundo — portanto, é uma das mais diversas das metrópoles. Soma-se a isso o fato de ser um dos lugares mais ricos e desiguais; logo, um dos maiores casos de estudo de conflito de classes que já existiu.
Dividem (disputam) o mesmo espaço também as mais diversas classes sociais. A área metropolitana abriga mais de 20 milhões de seres humanos diferentes e únicos: complexos e diversos. Famosos e anônimos, de Ferrari ou busão, dividem (disputam) espaço nas mesmas avenidas. Senta lado a lado no metrô quem tem dinheiro e quem não tem; quem tem carro e quem não tem; quem tem fé e quem não tem. Afinal de contas, são 7.900 pessoas por quilômetro quadrado. Multifacetada é a palavra que define.
Costumo dizer que algo é realmente raro quando é raro até mesmo em São Paulo. Aí é foda! Tudo que existe, tem nesta cidade; e, com sorte, dá para chegar de metrô. Com tantas faces diferentes coabitando e coexistindo, é estatisticamente impossível não haver ao menos uma que não lhe agrade; e, com sorte, te encante. O problema é que essa face vai sempre inevitavelmente ser uma parte muito, muito pequena de uma cidade esmagadoramente grande.
O que fazer, então? Resta uma eterna insatisfação, afinal, é uma cidade que poderia ser esmagadoramente foda. Mas não, ela é apenas uma cidade real: com as mazelas e problemas inerentes ao Brasil e ao primeiro quarto do século XXI. Não importa quantas galerias de arte underground possam abrir; a alguns só satisfaria Andy Warhol como prefeito. Resta essa coisa agridoce de lidar com a cidade como ela é pela perspectiva de como poderia ser.
O paulistano é fadado a uma resignada insatisfação inerente à vida em uma cidade onde tudo é tão grande.